(texto escrito e postado no Facebook em 2018 e adaptado em 2020 para este blog).
As lembranças são formativas porque construíram corpo/pensamento.
Eu gosto muito de dançar. Alguns de
vocês já sabem disso. Sejam as danças populares do Brasil e pops internacionais assim como me dedicar a
um estilo de dança específico. Tenho uma trajetória nas danças formais, apesar
de estar em falta por motivos vários nos últimos tempos. Mas este é outro
assunto.
Nessa minha reflexão sobre o gosto pela dança percebi que minha lembrança mais antiga sobre o movimento dançado e que me marcou profundamente foi quando Carla Perez surgiu. É verdade, fiquei fascinada com a desenvoltura da baiana se requebrando. Achei muito diferente de tudo que tinha visto, eu contava nesta época os meus sete anos. Daí também dá para entender meu gosto pelas danças e músicas pops. Foi essa cultura que marcou minha infância dos sete aos oito anos, não porque não houvessem outros elementos, mas essa foi bem presente e influenciadora, o axé baiano estava com tudo no início dos anos 90
Com nove, outras presenças se deram pois foi quando entrei para a minha primeira escola de dança. A primeira marca de gosto pela dança foi mesmo com a Carla Perez. Falo com graça e seriedade aqui. Nada se comparava ao entusiasmo que eu sentia ao ver Carla Perez dançando. Carla Perez! e não Débora Brasil. Achava a Débora muito contida, econômica nos movimentos, mesmo dando para perceber que ela também tinha vocação. A Carla não, a Carla dançava tudo que ela podia dançar e isso me fascinava. Ela parecia ter muito gosto pelo que fazia e sabia que era boa. Sua segurança me chamava atenção com a mesma força que seus movimentos e, acredito, que uma coisa alimentava a outra.
Era experimentação pura de movimentos
quando eu dançava as danças da Carla Perez, além de diversão com as amigas na
época. Lembro-me de na casa de uma dessas amigas (não é você Marcelinha)
dançando o “Segura o tchan”, eu explicando para a amiga que não era só o
movimento com as mãos que fazia “tchan tchan tchan tchan” tinha que usar pelve
e quadril também. A irmã mais velha dela ao passar por acaso por nós que
ajustávamos os passos no momento, olhou para mim e disse “Igualzinho! É assim
mesmo”. Fiquei orgulhosa de mim, verdadeiramente.
Como eu já tinha exercitado vários
movimentos coreográficos a partir de Carla Perez foi muito difícil para mim
quando surgiu a Thalia. Minha segunda fascinação da infância. A mexicana não
sabia dançar. Além de não saber dançar, o que ela tentava era ruim, mas meus
olhos de fã fascinada não davam tamanha importância à falta de jeito dela. Foi
difícil para mim adaptar a movimentação volumosa, vigorosa e harmônica de Carla
ao "desengonçamento" inacreditável de Thalia. A intérprete de Maria
do Bairro (foi aí que minha paixão por ela começou - e ficou) era tão convincente em sua
falta de jeito que comecei a levar mais uma vez para o lado experimental.
Minimizar e desajustar o movimento propositalmente era o meu desafio
coreográfico, já que por conta da minha habilidade e pelo modelo de dança que
tive a partir do modo “Carla Perez’ eu saberia fazer - o que Thalia tentava -
no ritmo e de maneira harmoniosa.
Trago estas memórias para afirmar a cultura popular e sair da contradição artificial entre popular e a criação de pensamento. Podemos fazer análises sobre a cultura midiática e massificadora das subjetividades, mas neste texto a intenção não é esta. Aqui, pelo inusitado e gracejo, pretendi dizer do valor de descobrir a dança, de descobrir uma sensibilidade que meu corpo tem desde criança e desierarquizar a cultura.
Vamos desdobrar esta ideia em outros posts.
Comentários
Postar um comentário